segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

O Pintassilgo - O que um pássaro acorrentado num poleiro pode nos ensinar sobre a vida?

Li nestas férias um romance da autora Donna Tartt (vencedora do prêmio Pulitzer) chamado O Pintassilgo (2014). O nome do livro faz referência a uma pintura de um artista holandês chamado Carel Fabritius (1622-1654), discípulo de Rembrandt e mestre de Vermeer. Faleceu numa explosão aos 32 anos. A tela está exposta no museu Mauritshuis, em Haia - Holanda (após o sucesso do livro, o quadro passou a ser um dos mais procurados no museu).




A história é narrada pelo personagem principal Theo Decker dos 13 até seus 27 anos,  a trama se inicia com um atentado terrorista que acontece no Museu Metropolitan (NY), onde Theo e sua mãe estavam. A tragédia acaba por levar a morte da mãe e o envolvimento de Theo com a famosa pintura do Pintassilgo, da qual sua mãe tinha um grande apreço.

O livro explora as dores do ser humano, principalmente as perdas em nossas vidas, e da forma como, às vezes, acabamos cambaleando dentro da nossa existência, sem saber o motivo de ainda estarmos vivos.

O enredo segue com personagens que vão adquirindo grande importância para a vida de Theo e que direta ou indiretamente o acompanham até o final da trama. Praticamente todos eles com um mal que assola a humanidade nos dias atuais "Os transtornos mentais" tais como: TEPT (Transtorno pós-traumático), depressão, bipolaridade, alcoolismo e as drogas.

Além da profundidade que a autora consegue discorrer sobre as vicissitudes da alma humana, o que mais me chamou a atenção foi a saga que acompanha Theo e a tela do Pintassilgo, a forma que ele se manteve ligado a ela (a pintura foi a última lembrança com sua mãe viva) o levou a muitas loucuras e sofrimentos, tornando-o prisioneiro da sua própria vida. Seu apego  aconteceu da mesma forma que nós em muitos momentos nos apegamos e protegemos as últimas lembranças de pessoas que foram importantes em nossas vidas, entes queridos que já se foram ou alguma situação ou época de nossas vidas em que nos sentíamos felizes e plenos. Nos agarramos tal e qual a uma tábua de salvação.

A trama mostra o quanto isso é em vão, o quanto as lembranças e a (falsa) segurança de guardar algo pode em muitas circunstâncias nos aprisionar e impedir de dar seguimento a nossas vidas.

Falo das imagens que salvamos em nosso HD mental, por exemplo: éramos felizes naquela época ou com aquela pessoa, ou naquele emprego... Penso que ao gastarmos energia e tempo para preservar tais lembranças (às vezes a deixamos até mais bonita do que realmente foi) acabamos por abandonar o aqui e agora do que de fato estamos vivendo.

E quando prestamos atenção na pintura tão famosa do "Pintassilgo" percebemos que ele está acorrentado em seu poleiro. Significativo não é mesmo?

  



Quem tem o hábito da leitura sabe o quanto nos sentimos órfãos dos personagens que nos acompanharam por alguns dias, eu pelo menos fico revivendo cada detalhe da vida de cada um, suas alegrias, tristezas e angustias. Embora seja um romance, o livro estaria muito melhor classificado em drama... Drama da vida real, onde a solidão é expressa de uma forma tão intensa que mexe com as nossas próprias dores da existência.

A autora não criou nem mocinha e nem bandido, e ninguém para ser salvo por ninguém, pois cada um está a sua maneira tentando sobreviver.

Para mim é o real segredo da vida. O livro me trouxe essa verdade de uma forma tão declarada que num primeiro momento me deixou um pouco desolada, pois inconscientemente ou conscientemente eu queira ver alguém salvando Theo ou dando sentido para a vida daquele pobre ser humano.

Mas não... Cada um de nós está acorrentado à própria vida, ninguém tem como salvar ninguém. O Pintassilgo, esse sim foi colocado lá por alguém, mas será que sendo livre conseguiria sobreviver? E quando temos a impressão de que alguém nos acorrentou, será que não permitimos? Quais ganhos secundários se têm com nossa prisão psíquica e às vezes até física?

Em alguns momentos percebo que Theo fez o que todo ser humano em determinado momento da vida faz... Corre desesperado por uma migalha de amor e de atenção... Ele como qualquer ser humano quer ser cuidado.

Mas essa tarefa só cabe a ele, mas ainda assim, passei 720 páginas torcendo para que alguém o resgatasse...E não é exatamente dessa forma que às vezes passamos a viver cada dia das nossas vidas? Agora vou encontrar alguém que me valorize; agora fulano vai me amar; agora vou ser recompensado, agora as pessoas vão ser gratas...

Theo acabou (ou iniciou) sua jornada descobrindo o mundo sozinho... Ele continuou com todos os seus fantasmas e dores... Ninguém o salvou, até porque algumas de nossas dores vão nos acompanhar até o último suspiro... E este é o mistério da vida...

Estamos presos de alguma forma à uma, ou várias, história(s) triste(s), uma dor de abandono, de alguém que não existe mais em nossa vidas, de um amor não correspondido, de um trabalho que não é mais desejado...
Às vezes a corrente é pesada demais outras ela é tão leve que nem percebemos... Mas ela é limitadora... Ela está ali para nos lembrar de que a dor existe... Que iremos sofrer, que estamos sozinhos para resolver questões íntimas da nossa vida, que depende só de nós para sermos quem queremos ser.. E que sim, a dor não é uma escolha, mas passar a vida em sofrimento é...


Desejo que nossos Pintassilgos possam voar o quanto tiverem fôlego, que se permitam pousar e apreciar sua jornada, e que possam se desvencilhar da maioria das correntes e que a outras... As aceite... das correntes e que a outras... As aceite...

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Sobre ser perfeccionista


Sobre a nossa mania de perfeccionismo, que nos algema e nos faz ser controladores..Nada nunca está bom o suficiente..

Se liberte..viva mais leve, Se permita errar...Se envolva mais...Coloque seus sonhos para fora do papel e da sua mente...





terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Do nosso lado de dentro só nós sabemos o que se passa...



Hoje conversando com um paciente, falávamos sobre a dor da solidão, não a solidão do lado de fora... Mas a solidão do lado de dentro.
A depressão e com ela pensamentos suicidas são mais recorrentes do que possamos imaginar, acontece em todas as classes sociais e em diferentes idades, e muitas vezes convivemos ao lado destas pessoas sem ao menos suspeitar da dor que está se passando dentro delas.
Os depoimentos de pacientes que estiveram muito próximos ao anseio de tirar a própria vida é desesperador... Pode parecer contraditório, mas eu diria que é um vazio cheio de dor, onde eu pude ver e ouvir a magnitude dessa dor pelo olhar distante e a voz que sai de dentro de alguém que parece não existir mais naquele momento, é a morte em vida.
Todos nós podemos ser acometidos por este terrível pesadelo, que é gerado por vários fatores, às vezes situações óbvias de dor e desamparo como perder alguém importante (seja por morte, separação ou abandono), às vezes essa dor é construída diariamente pelo alto nível de stress e exigências de um mundo cada vez mais capitalista ou até mesmo por altos níveis de cobrança interna de cada um, junte tudo isso a situações desconfortáveis existentes em nossa vida social e familiar, e ainda fatores genéticos (segundo a ciência).
O que escrevi até agora é uma introdução para um paralelo que quero fazer sobre esse sentimento de vazio (de dentro da gente). Li um livro nestas férias (em breve postarei um texto sobre ele) do qual me chamou a atenção a conversa de uma mulher (esposa de um homem bipolar, e bastante entendida sobre dor e desilusão) com um adolescente que havia sido abandonado pelo pai e acabado de perder a mãe num atentado terrorista; ela perguntou para esse menino: “O que você gosta de fazer no seu tempo livre?” Claro que ele citou ”jogar vídeo game”, mas ela persistiu... “O que estou tentando dizer não é tanto o que você faz, só queria que pudéssemos encontrar uma forma de te deixar mais conectado”. Ela estava tendo essa conversa, pois sabia que o menino havia perdido a conexão mais saudável em sua vida até aquele momento, a mãe dele.
Conectado a quê? Ele perguntou.
E é essa reflexão que eu gostaria de fazer: A que ou a quem você anda conectado e o que isso tem acrescentado em sua vida? Está conectado a pessoas tóxicas? A internet? Vasculhando a vida dos outros e comparando com a sua? Conectado num trabalho que você não vê mais sentido? Lendo e mandando mensagens vazias que te tomam seu precioso tempo?
Claro que o ócio, a curiosidade, jogos e conversas online (você não estaria lendo este texto se não estivesse conectado a internet) tudo isso faz parte da vida moderna, onde a tecnologia nos permite entrar na vida das pessoas e do mundo e nos entreter com apenas um click. Mas isso está sendo suficiente para preencher a sua vida? Falo daquela vida do lado de dentro e que podemos chamar de saúde emocional e física, pois não separamos nosso corpo é ele quem carrega toda nossa existência.

Se permita esta pequena reflexão, reveja seus padrões de conexão! Saia de grupos que não te agregam e se permita ir alem com grupos que são importantes e marque encontros ao vivo e a cores, avalie quem você segue nas mídias sociais e se pergunte o que me acrescenta?  É entretenimento, matar a saudade de quem está longe, curtir e ficar feliz com postagens de quem você admira; aprender e se manter informado com temas de sua preferência... Tudo isso se te acrescenta e faz bem, OK, se não for nada disso, pare de jogar seu precioso tempo no lixo. Esteja conectado com você acima de tudo! Crie hábitos saudáveis e hobbies que tem importância em sua vida... A Jovem senhora termina a conversa com o menino dizendo: “Você ficaria surpreso com como coisas pequenas e cotidianas podem nos tirar do desespero. Mas ninguém pode fazer isso por você. Você é que tem que prestar atenção na porta aberta”.